Sobre o vazio mental, a inércia e o tédio e como fazem parte de nós
Palavra de honra que hoje estou a zero.
Eu gostava de escrever o artigo semanal com a estrutura literária à qual me proponho na minha escrita e hoje…zerinhos.
E como não sou de mentiras, fui falar com o chat gpt. Sim, sim. Eu adoro este menino e trabalho muito com ele. Hoje não foi diferente e a conversa foi assim:
Eu: “olá chat gpt tudo bem? Pronto para mais uma ajuda ao slow living portugal?”
Chat GPT: “Olá! Tudo ótimo, e contigo? Sempre pronto para ajudar o Slow Living Portugal! O que vamos fazer hoje? 😊”
Eu: pois não sei…chego a este domingo sem ideias do que escrever para o post semanal
E como ele é bastante simpático e prestativo respondeu-me com algumas ideias meio genéricas e idílicas do desacelerar, relaxar, promover a presença…bla bla bla…whiskas saquetas.
Que carago, vou simplesmente falar sobre o que hoje quero falar: sobre nada. Sobre a cabeça estar a zero, sobre o silêncio intelectual, sobre ter arbustos do faroeste a rebolar entre neurónios (eu ia dizer que estes arbustos tinham um nome…se te lembrares, dá uma apitadela, por favor.)
“Hoje não dei uma para a caixa!” – a maldição da improdutividade
“Hoje não fiz nada de jeito, estava sem energia, não adiantei trabalho…que porra de dia!”. Penso que sofremos de uma terrível maldição moderna:
NÃO SER PRODUTIVO! (*gritos de desespero*)
Quem, na sua perfeita sanidade, que sentir e admitir que não fez um car****?!
“Não fez nada…não QUIS fazer nada!” – dirão os sábios profissionais e masters em coaching e colarinhos brancos de expectativas fatais. Vamos lá ver uma coisa…ainda não conseguimos aceitar que somos membros de um ecossistema oscilante e imprevisível?
Em pleno 2º quarto do século XXI ainda temos que abordar a humanidade e como somos suscetíveis à falha, à preguiça e à inércia?
Para quem precisa de ler isto: está tudo bem. Está tudo bem em não concluirmos tarefas e não alcançar objetivos. Está tudo perfeitamente bem em teres passado o teu domingo enfiado no sofá sem sequer ter lavado um prato. E sabes porque está tudo bem?
Há dias e dias! E todos eles fazem parte do nosso equilíbrio produtividade/ócio.
É verdade, sim sr.! Aparentemente temos todos dias mais ativos e outros mais preguiçosos. Juro pela minha saudinha.
Há um senhor de tal nome Andrew Smart, profissão: neurocientista, que defende que períodos de inatividade são essenciais para o cérebro estabelecer novas conexões, promovendo o autoconhecimento e a criatividade, e que o descanso mental não é apenas benéfico, mas necessário para manter a saúde cognitiva e a eficiência no trabalho. Portanto, incorporar momentos de ócio na rotina diária não é um sinal de improdutividade, mas uma estratégia fundamentada cientificamente de manutenção mental.
Cum carago, então não é que o vazio mental é uma manifestação saudável do cérebro humano?
E nós aqui, tolinhos, a achar que a malta é preguiçosa e só não quer fazer o seu trabalhinho. Ai, ai, seus malandros!
A culpa do vazio mental
Entre o silêncio e o vazio mental, há um campo fértil onde ideias e raciocínio proliferam. Mas para isso, precisamos de permitir-nos estar nesse espaço sem culpa, sem a urgência de preencher cada momento com produtividade.
Independentemente do credo de cada um, mas meu caro…até Deus teve que parar um dia. E tenho a certeza que não acordou no sétimo dia a questionar-se se preencheu bem os formulários de Gestão de Pluviosidade ou se fez bem o inventário de Primeiras Formas de Vida. Não me parece que tenha ido correr 3km porque “não é interessa se é domingo, não há desculpa para não fazer exercício”. Confio que Deus tenha se sentado no sofá de cuecas, com uma cerveja na mão e tenha passado o dia a ver a Star Movies; chegou ao fim desse domingo relaxado e pronto para o início da Vida.
Esquece os relatórios de produtividade, esquece os coachs, esquece os influencers, esquece os outros…e permite-te estar em vazio. Experiencia esse “nada”, vive-o sem culpa e sem pressão.
“Pois, é tudo muito lindo, mas onde cabe a vida real, Sara? Quando não tenho outra opção senão ‘fazer’?”
É…há momentos em que não temos opção. E senão temos opção, olha que porreiro!, nem temos que gerir a culpa de não fazer nada.
Brincadeira à parte – há modos de vida onde o descanso estratégico não se encaixa. Mas até quando…? Até quando nos damos ao luxo de abusar de uma capacidade limitada de produtividade? E estamos preparados para lidar com o fim dessa capacidade? Não estamos, é essa a verdade áspera de engolir.
Dormir é uma perda de tempo, alguns consideram. Mas aqui nem é negociável – ao fim de 3 dias sem dormir, até alucinações temos. E talvez, possamos começar a olhar para estes momentos de “inutilidade” com um fim profilático, como uma forma de promover e exercitar a saúde mental. Senão nos permitimos a nós próprios ter dias sem produtividade, sem criatividade e sem mostras de seres humanos úteis, então do que somos, realmente, capazes?
A capacidade de ser incapaz é natural e necessária. Se hoje, e em tantos outros dias, estás a zero em energia, em criatividade e entediado até aos ossos…vive isso. Deixa acontecer. Não há propriamente razão para não o ser
E, por favor, que não me venha ninguém dizer “Claro, agora vou dizer ao meu chefe que hoje não fiz o meu trabalho porque estava a nutrir o meu solo para novas ideias…ahahahaha!” – não preciso de fazer disclaimer, certo? Eu acredito na Carta Universal dos Dois Dedos de Testa, e como tal, acredito no equilíbrio e na relativização das coisas.
Obrigada por estares desse lado,
Sara – Slow Living Portugal