Um possível antídoto?
Estes 5 últimos meses têm sido o descobrir de uma jornada que se revelou muito diferente do que esperava.
Desde já gostava muito de agradecer a quem me deu um voto de confiança ao acompanhar-me nesta viagem através deste cantinho e do Instagram. E na realidade, o texto desta semana é dedicado a vocês que tiveram a curiosidade, alguma paciência e o desejo de explorar o tema Slow Living.
E a pensar em ti que estás desse lado, que me conheces desde Outubro de 2023 ou que chegaste até aqui na semana passada, vou pôr em cima da mesa as práticas do Slow Living e como elas se enquadram no nosso dia-a-dia, para que possamos refletir juntos.
Ética do Tempo – Mais depressa
Num mundo onde a pressa é a norma e a velocidade é celebrada como um marco de produtividade, sinto ainda mais aceso o desejo incandescente de cultivar um estilo de vida que valoriza os ritmos orgânicos e com qualidade. E o que é que se são ritmos orgânicos?
São ritmos que respeitam a “ética do tempo”. E hoje o tempo é ouro. Paradoxalmente, o tempo é um bem de grande valor e muito do nosso consumo gira à volta da otimização do tempo – os equipamentos que nos permitem poupar tempo das atividades rotineiras, a compra feita em pouco tempo, a rapidez com que os produtos nos chegam até nós, os essenciais que permitem-nos priorizar o tempo… Nesse sentido, foram criadas expectativas que são contranatura, ou melhor, contrarrelógio.
As plantas crescem mais depressa, os animais crescem mais depressa, nós desenvolvemo-nos mais depressa… e como? E a que custo?
Ser Slow
A primeira vez que vi a expressão Slow Living na minha plataforma preferida – Pinterest – disse a mim própria “É esta a vida que quero!”. Mas à medida que pesquisei mais sobre o tema, mais me apercebi que estava perante uma fase muito embrionária do que pode ser um antídoto para um vida intoxicada muito comum nos dias presentes.
O que é o slow living? Para mim, é muito mais do que uma simples tendência, muito mais que um apelo à leitura de um bom livro acompanhada de um chá: é uma possível filosofia de vida que nos convida a abrandar o ritmo, a saborear cada instante com atenção plena, a reconectarmo-nos com o que realmente importa.
É início de uma vida vivida significativa e internacionalmente.
Mais que uma vida desacelerada – uma vida natural, orgânica e genuína.
E há 3 pedras basilares que valem muito a reflexão.
Trabalho – a medalha de cortiça
São tempos frenéticos e maníacos estes em que vivemos, e é fácil nos perdermos nesta correria, sacrificando os preciosos momentos passados com quem nos é mais querido, em prol de compromissos profissionais ou da busca incessante por sucesso e reconhecimento.
O estatuto profissional é um feitiço – uma poção inebriante que nos permite ser alguém com valor, produtivo, interessante, inteligente. Mas (genericamente falando) bate as 18h e o feitiço quebra-se. Voltamos à vida real que de apelativo não tem nada. Voltamos a casa. Vem o “sugar crash” de um dia tão dinâmico.
E é tão fácil cairmos nesta paixoneta, não é? Porque no trabalho há tantas falhas e momentos maus mas “somos essenciais à equipa”! Quem não gosta de se sentir essencial?
Mas a verdade é uma: daqui a 5 anos quase ninguém vai saber/lembrar-se dos e-mails ou das apresentações que tinhas IMPRETERIVELMENTE concluir, sacrificando a tua presença junto de quem realmente te quer. E são essas pessoas que te querem, as únicas que se vão lembrar disso. O teu melhor amigo sabe que faltaste ao 31º aniversário dele, o teu filho lembra-se que a mãe não esteve na plateia na festa de final de ano, a tua avó sentiu-se sozinha quando adiaste mais uma vez a visita ao lar.
O pior, é que tu próprio não te vais lembrar porque é que falhaste com estas e tantas outras pessoas.
Onde entra o Slow Living aqui? É a tua gestão pessoal das tuas prioridades. Onde se encaixa o tempo de trabalho e o tempo de vida. Até onde queres que o trabalho interfira na tua vida.
Se estiveres a pensar no quanto é difícil dizer não ao chefe ou ao patrão, reflete no quanto é difícil ouvir não de quem se ama. Esse “não” não queres ouvir. E o não no emprego é muito mais fácil do que imaginas.
Conhece a lei (os teus direitos e deveres) e confia nos teus valores. Tens mais força do que imaginas. Acredita em mim: eu era a pessoa que não ia ao dentista por ter vergonha de faltar ao emprego. E a questão é que não me lembro minimamente que empresa ganhou à minha saúde oral, mas sei perfeitamente os resultados obtidos dessa troca de prioridades.
Somos o que comemos:
Slow Food
A alimentação é uma pedra basilar de um estilo de vida consciente.
Somos dominados por alimentos processados e industrializados, tornando tão fácil cair na armadilha da conveniência, esquecendo-nos do poder transformador de uma alimentação saudável e equilibrada.
A comida deve ser mais do que apenas nutrição: deve ser uma celebração da vida.
Convenhamos: o dia-a-dia não nos permite fazer do nosso tempo de refeição um ritual extraordinário. Mas torna o ordinário mais significativo.
Reflete bem no que comes! Com índices de desordens alimentares e obesidade que se tornaram num problema de saúde pública sem precedentes, está na hora de contrariar em absoluto este tipo de consumo.
Onde entra o Slow Living aqui? “Mas eu não gosto de cozinhar” ou “Já tentei mas não consigo criar ou reproduzir receitas com qualidade mínima.” – ESTÁ TUDO BEM! Mas não caias na premissa do não tenho tempo para cozinhar. E se isso for um facto na tua vida – pois há estilos de vida tão voláteis que uma agenda estrutural é um ato hercúleo (falamos de médicos, camionistas, forças de segurança, trabalhos por turnos e tantas outras realidades).
Mas procura colmatar a falta de qualidade do que ingeres. Há diversos pequenos negócios que podem fazer chegar refeições nutritivas e saudáveis até ti, por exemplo. Se conhecimento de confiança é o que cria resistência, consulta um especialista de nutrição. Se finanças te impedem de investir em qualidade e diversidade em ingredientes, faz uma adaptação ao teu regime ideal, procura fornecedores locais ou inspira-te nas receitas simples tradicionais e adapta-as com opções mais saudáveis.
Mas penso que podemos considerar que, se existir uma prioridade no teu top 5, será com certeza a alimentação. Esta área da minha vida está neste momento a ser avaliada com muita seriedade. Pois eu sou uma mulher obesa, já com um vício confessado em açúcar e, com os meus 33 anos, sinto-me intoxicada pelo que como. E não, não quero ser mais o que como.
Um corpo estagnado, um corpo condenado
É, é exatamente isto que vou falar agora – exercício, movimento.
Nesta vida conseguimos apurar algumas verdades absolutas: a morte, a matemática e os benefícios do exercício físico.
E vamos tornar isto um mantra: nós não fomos feitos para estar sentados 8h+ por dia! Repete as vezes que forem necessárias.
Não fomos feitos para trabalharmos e deslocarmo-nos sentados. O nosso corpo consegue suportar esta prática até um certo ponto. A partir daí, os problemas começam a surgir. E o podre disto é que as consequências já começam a ser visíveis e atestados em crianças e jovens. Estamos a criar gerações com mobilidades deficientes e doenças mentais.
As crianças não podem ser submetidas a horas seguidas de estagnação numa cadeira de sala de aula. E enquanto sociedade não estamos a perceber que aquela criança não é inquieta demais para os padrões (que, convenhamos, foram criados para manter um nível desejado de submissão às regras) ao ponto de “criarmos” doenças como défice de atenção, hiperatividade e outros distúrbios de comportamento, assim como ansiedade e depressão? Elas existem de facto, frutos de fatores internos do indivíduo. Mas podemos falar abertamente, sem prejuízo de competência médica, sobre o impacto que a falta de movimento tem nas crianças e jovens?
Onde entra o Slow Living aqui? Mais uma vez, a tua consciência e sensibilidade para o facto de que muitas das doenças ou perturbações que surgem em idades precoces advêm, numa escala preocupante, da falta de exercício físico. Adapta a tua rotina! Faz disto mais uma prioridade do teu top 5. Trabalhas em escritório, sentado? Bola de pilates em vez de cadeira, mini pedais para colocar debaixo da secretária, faixas elásticas para movimentar as pernas com resistência, caminhada após o almoço, caminhada após o jantar. Movimentas-te durante o dia mas não o suficiente para se refletir na tua saúde física? Intensifica o teu movimento com exercícios que incidam na utilização de determinados músculos, aumenta a velocidade de marcha, utiliza determinados objetos com peso (caixas, volumes, mochila) em manobras complementares. Não gostas de ginásio? Há milhares de alternativas e tu sabes que as há!
O difícil é quebrar a inércia (quanto é difícil!). Ouvi esta expressão de um enfermeira há 2 anos: “quanto mais coça, mais vontade tem de coçar”. Precisamos de reinventar uma sociedade produtiva em movimento.
Mais que viver devagar, quero viver com vagar!
Ao adotar uma vida que dispensa o viver para ontem e amanhã, abraçamos uma jornada em direção à autenticidade e significado. Ao priorizar a qualidade sobre a quantidade, cultivamos relações mais profundas, momentos mais gratificantes e uma conexão mais íntima conosco próprios e com o mundo ao nosso redor.
Desacelerar não é apenas uma escolha de estilo de vida, mas uma busca consciente por uma existência mais plena e satisfatória. Honremos o presente, valorizemos o tempo e simplifiquemos as nossas vidas, encontrando a verdadeira riqueza até nos momentos mais banais.
O que te passa ao lado pode estar a tentar ensinar-te lições valiosas.
Obrigada por estares na minha companhia e por poder partilhar esta jornada contigo.
Vamos?
Sara – Slow Living Portugal